História da Copa do Mundo de 1962

Chile, 1962 – Novamente, Brasil

Mais uma vez o número de países inscritos para a Copa do Mundo aumentava: 56 seleções. Era a prova incontestável de que o Mundial caminhava a passadas largas rumo ao sucesso. Há muito, deixava de ser uma experiência e, aos poucos, desprezava o papel de simples torneio para se tornar, ao lado dos Jogos Olímpicos, o maior evento esportivo do planeta.

O Chile, país anfitrião desta Copa, recuperava-se de um terrível terremoto, dois anos antes, que muito danificou o país.

Dois times sul-americanos, Brasil como campeão e Chile como país-sede, integravam, por antecipação o grupo dos 16 participantes do Mundial. Os outros 14 selecionados eram: Argentina, Uruguai e a estreante Colômbia, pela América do Sul; México, pela Concacaf; Alemanha Ocidental, Espanha, Hungria, Inglaterra, Itália, Iugoslávia, Suíça, Tchecoslováquia, URSS e a estreante Bulgária; pela Europa. Foram 2 estreantes, 5 seleções que retornaram após a ausência em Copas anteriores e 9 seleções que participaram de forma consecutiva.

O torneio foi disputado no mesmo sistema de 1958, mas com a introdução da utilização de critérios técnicos para a classificação na Primeira Fase em substituição ao jogo de desempate. Esta fórmula de disputa foi mantida até 1970.

A seleção brasileira viajou ao Chile praticamente com o mesmo time campeão em 1958. Apenas alterações na zaga foram feitas.

O Brasil estreou, pela terceira vez em sete Copas, contra o México, o que também ocorreu em 1950 e 1954, e estabelecia um recorde de confrontos sem sofrer gols do adversário nesses três jogos ao vencer por 2 x 0, fato só seria igualado em 1990 pela Itália. Também foi a 5ª vitória consecutiva dos brasileiros em Copas, somando-se às 4 da Copa de 1958, marca que se tornou a segunda melhor até então, atrás apenas das 7 vitórias consecutivas dos italianos entre as Copas de 1934 e 1938 e que foi igualada na Copa seguinte e superada em outras três vezes posteriormente. O gol de abertura dos brasileiros, marcados por Zagallo, foi o 10º gol sobre os mexicanos. Esses jogos entre Brasil e México foram, aliás, os únicos confrontos entre as duas seleções em Copa até o retorno ao Brasil, em 2014. Também era o primeiro confronto a se repetir por três vezes com a participação de um selecionado não pertencente ao eixo Europa/América do Sul, no caso, o México. Além disso, o Brasil era a primeira seleção a participar de uma Primeira Fase conhecendo todos os seus adversários através de confrontos em Copas anteriores.

No segundo jogo, contra a forte Tchecoslováquia, perdemos o astro principal de nossa seleção; Pelé, ao tentar um chute de longa distância, sofre distensão em sua virilha e abandona o torneio. O Brasil recua e o jogo termina num cauteloso 0 x 0. Para sorte brasileira, o botafoguense Amarildo, substituto de Pelé, não decepciona. Entra no jogo contra a Espanha e faz o gol da virada brasileira, no final do segundo tempo: Brasil 2 x 1 Espanha. É bem verdade que em um lance na área brasileira, Nilton Santos fez pênalti no jogador espanhol Rodriguez, não anotado pelo árbitro. O zagueiro brasileiro, malandramente, deu um passo à frente após fazer a falta e o árbitro chileno, Bustamante, anota apenas a falta fora da área.

Ainda pelo grupo do Brasil, a vitória de 1 x 0 da Espanha sobre o México marcou o gol de número 50 dos europeus sobre seleções da Concacaf, gol anotado pelo espanhol Joaquim Peiro no último minuto de jogo. E no jogo México 3 x 1 Tchecoslováquia, o gol de abertura dos tchecos, com Vaclav Masek, estabeleceu um novo recorde como gol mais rápido em Copas, aos 15 segundos de jogo, marca que só foi quebrada em 2002. Essa vitória do México, aliás, além de ser a primeira vitória desde a estreia da seleção mexicana em Copas, quebrou uma péssima sequência de 13 jogos sem vitória, a maior sequência negativa até então e a pior entre as seleções da Concacaf.

Pelo Grupo B, Itália e Alemanha Ocidental protagonizavam o primeiro confronto em Copas de seleções já campeãs e o curioso é que esse confronto ocorreu logo na Primeira Fase. O resultado, no entanto, foi um decepcionante 0 x 0.

Já pelo Grupo A, a Iugoslávia participou de três curiosidades da história das Copas, duas delas relacionadas aos sul-americanos. Primeiro, na vitória sobre o Uruguai por 3 x 1, aconteceu um dos confrontos de número 50 entre sul-americanos e europeus e, além do terceiro gol marcado pelos iugoslavos dando números finais ao placar, feito pelo jogador Drazan Jerkovic, ter marcado o gol de número 600 em Copas. A terceira curiosidade, na goleada de 5 x 0 sobre a Colômbia, Milan Gálic, autor do gol de abertura do placar também anotou o gol de número 100 de europeus sobre sul-americanos. Ainda nesse grupo, o empate de 4 x 4 entre Colômbia e Rússia igualou o maior placar de empate em Copas, igualando a marca de 1954, entre Inglaterra e Bélgica, só que desta feita com a participação dos sul-americanos da Colômbia.

No jogo entre Hungria e Bulgária, pelo Grupo D, outro gol foi anotado antes de 1 minuto de jogo. O húngaro Florian Albert abriu o placar aos 50 segundos de jogo. Já no confronto entre ingleses e argentinos, no mesmo horário de Iugoslávia e Uruguai, também marca o 50º confronto entre europeus e sul-americanos, novamente com 3 x 1 para a seleção europeia. Outros dois resultados em 0 x 0 aconteceram na rodada final deste grupo, sendo que o jogo entre Argentina e Hungria tornou-se o 10º empate entre sul-americanos e europeus em Copas.

A partir dessa Copa, os critérios de saldo de gols e gols marcados passaram a servir de desempate na classificação para a próxima fase e não tivemos mais os tais Jogos de Desempate ou Jogos Extras em Copas futuras.

Classificados para as Quartas de Final, os brasileiros enfrentariam a esquadra inglesa. Era a primeira vez, depois de três Copas, que os inventores do futebol passavam da Primeira Fase. Numa partida antológica de Garrincha, que, segundo cronistas da época, resolvera jogar por ele e por seu “amigo” Pelé, o Brasil vence por 3 x 1. Neste jogo, um fator extracampo marcou o espetáculo. Dois cães invadiram o gramado em momentos diferentes da partida, obrigando o árbitro a paralisar por duas vezes o jogo, até que os mesmos fossem retirados, o que aconteceu com o primeiro, ou saíssem de campo por livre e espontânea vontade, caso do segundo cão.

Em outra partida válida pelas Quartas de Final, Alemanha Ocidental e Iugoslávia repetiam pela terceira Copa consecutiva o confronto nessa mesma fase. Enquanto a Alemanha Ocidental venceu e chegou às Semifinais em 1954 e 1958, nesta Copa quem levou a melhor foi a Iugoslávia, pelo mesmo placar de 1 x 0 da última derrota, em 1958.

O anfitrião Chile passou pela favorita URSS e a Tchecoslováquia desclassificou uma já decadente Hungria, ambos campeões olímpicos em Olimpíadas recentes.

Nas Semifinais, sul-americanos e europeus dividiam as vagas para a final. A Tchecoslováquia enfrentou e venceu por 3 x 1 à Iugoslávia. Já o Brasil enfrentou os donos da casa. Garrincha, mais uma vez numa estonteante jornada, marcou os dois primeiros tentos do Brasil. O Chile diminuiu antes do final do primeiro tempo e os gols se repetiriam no segundo tempo. Números finais: Brasil 4 x 2 Chile. No final do jogo, Garrincha, infantilmente, acertou o jogador Ramirez, que o perseguiu o jogo inteiro, sendo expulso de campo. Num julgamento polêmico, 48 horas depois, Garrincha foi absolvido, podendo entrar em campo no jogo final.

Novamente, como em 1954, a final da Copa repete um dos jogos da Primeira Fase. No estádio Nacional de Santiago, Brasil e Tchecoslováquia entram em campo para a decisão do título. Era a primeira vez na história das Copas que dois selecionados se confrontavam pela quarta vez. Mais que isso, Brasil e Tchecoslováquia jogaram quatro jogos em duas Copas; além destes dois jogos em 1962, ambos haviam se enfrentado por duas ocasiões em 1938, sendo, um dos jogos, de desempate.

Pela quinta vez, em sete finais, a seleção que se tornaria campeã começou perdendo. Masopust abre o placar para os tchecos. Logo em seguida, Amarildo, o substituto do Rei, empata. E termina assim o primeiro tempo. No segundo tempo, Zito e Vavá davam números finais ao jogo, 3 x 1, e o segundo título ao Brasil, igualando-se a Itália e Uruguai. O Brasil ainda igualava o feito da Itália de vencer duas Copas consecutivas. Foram as únicas duas vezes que tal fato ocorreu. Vavá, do Brasil, se tornava o primeiro jogador a marcar 3 gols em finais de Copa do Mundo, com 2 gols em 1958 e 1 gol nesta Copa, e o maior artilheiro brasileiro em Copas até então, com 9 gols. Pelé, em 1970, igualaria a primeira marca e superaria a segunda marca. A vitória do Brasil também marcou o novo recorde de invencibilidade em confrontos, igualado na Primeira Fase e superado nesta partida final, com quatro jogos sem perder para os tchecos. Também superou a marca de invencibilidade alcançada pelo Uruguai em 1954, com 12 jogos invictos, que somado ao jogo de estreia da próxima Copa, dará ao Brasil a maior invencibilidade da História das Copas, com 13 jogos sem ser derrotado.

O jogador brasileiro Nilton Santos, ao participar da final da Copa, tornou-se o mais velho jogador brasileiro a jogar em Copas, aos 37 anos e 32 dias, e o mais velho jogador brasileiro e sul-americano a disputar um jogo decisivo. A marca de jogador brasileiro mais velho em campo foi superada na Copa seguinte, mas o mantém como o segundo brasileiro mais velho da história das Copas, enquanto que a participação em finais é um recorde que ainda pertence ao jogador, tanto entre brasileiros quanto entre sul-americanos, além da segunda marca de jogador mais velho a vencer uma Copa.. Além disso, Nilton Santos, ao lado de Djalma Santos, terminou sua 3ª participação em Copas, tornando-se um recorde para época, quebrado por Djalma Santos na Copa seguinte. Já o goleiro mexicano Carbajal superou essa marca nessa Copa ao participar da 4ª Copa consecutiva, marca que ainda quebraria na Copa seguinte.

A experiente seleção bicampeã mundial também trouxe em sua equipe os jogadores Didi, com 33 anos e 252 dias, e Djalma Santos, com 33 anos e 110, respectivamente o 2º e 3º jogador brasileiro mais velho a disputar e vencer uma final de Copa do Mundo. O volante Zito, aos 29 anos e 313 dias, tornou-se o mais velho jogador brasileiro a marcar um gol numa final de Copa do Mundo, ao desempatar em 2 x 1 o jogo. Por outro lado, Amarildo, aos 21 anos e 323 dias, tornou-se o segundo jogador brasileiro mais jovem a disputar e a marcar gol em uma final, ao empatar o jogo para o Brasil em 1 x 1, sendo superado no quesito participação apenas em 1970, mas mantendo ainda hoje a terceira marca de mais jovem.

Não houve necessidade de prorrogação nas fases de Quartas de Final, Semifinais, disputa de 3º lugar ou na Final dessa Copa.

No final de um torneio de baixo nível técnico, em que 32 jogos ocorreram com apenas 89 gols, numa média muito ruim para a época de 2,78, o Brasil terminou como o melhor ataque, com 14 gols em 6 jogos e igualou a marca da Copa anterior de campeão invicto em 6 jogos. Isso também se refletiu no artilheiro da competição, que teve o título dividido entre seis jogadores com apenas 4 gols: os brasileiros Garrincha e Vavá, o chileno Lionel Sánchez, o húngaro Flórián Albert, o iugoslavo Drázán Jercovik e o soviético Valentin Ivanov. Pela primeira vez na história das Copas, o artilheiro, ou um deles, pertencia ao selecionado campeão. Além disso, igualou a marca da Hungria em 1938 e 1954 ao alcançar o posto de melhor ataque pela segunda vez, repetindo 1950.

Era hora do Brasil começar a sonhar com o tricampeonato.