História da Copa do Mundo de 1982

Espanha, 1982 – O desastre de Sarriá

Mais uma vez o número de países inscritos aumenta. Desta vez foram 109 os interessados no Mundial da Espanha. Era a primeira Copa que receberia 24 seleções, ao invés das 16 planejadas desde o primeiro Mundial. Embora nas primeiras Copas houvesse dificuldade em reunir 16 seleções, o número crescente de interessados levou a tal decisão após 11 torneios. O aumento de oito seleções causou um “boom” de estreantes. Cinco novas seleções se apresentaram nos estádios espanhóis, um recorde não alcançado nem mesmo pela Copa de 1998, na França, que também teve um aumento de oito seleções. Pela primeira vez na História das Copas, o futebol teria um representante de cada continente. Eram eles: Argentina, Brasil, Chile e Peru, pela América do Sul; as estreantes Argélia e Camarões, pela África; o estreante Kwait, pela Ásia; a estreante Nova Zelândia, pela Oceania; El Salvador e a estreante Honduras, pela Concacaf; e Alemanha Ocidental, Áustria, Bélgica, Escócia, Espanha, França, Hungria, Inglaterra, Irlanda do Norte, Itália, Iugoslávia, Polônia, Tchecoslováquia e URSS, pela Europa. Também pela primeira vez a África levava dois representantes à Copa. Por outro lado, pela segunda vez, assim como em 1978, a Europa não estreava nenhuma seleção. Foram 5 estreantes, 8 seleções que retornaram após a ausência em Copas anteriores e 11 seleções que participaram de forma consecutiva.

O torneio foi inicialmente dividido em seis grupos com quatro seleções em cada um, que jogariam entre si, dentro do grupo. Os dois primeiros colocados de cada grupo passariam a fase seguinte. As doze seleções seriam divididas em quatro grupos com três seleções cada um, também jogando entre si dentro do grupo. Os vencedores de cada grupo se classificariam para as Semifinais e os vencedores das Semifinais, à final.

O Brasil chegava à Copa comandado por Telê Santana e com uma equipe que vinha afinada, após uma grande participação nas eliminatórias, com direito a goleadas, e uma estupenda passagem pelo Mundialito, realizado em 1981.

Na estreia, contra a URSS, um frango do goleiro Valdir Perez deu um grande susto na torcida e marcou o gol de número 50 sofrido por nossa seleção de seleções europeias. Mas com dois belíssimos gols no segundo tempo o Brasil conseguiu a virada e venceu o primeiro jogo por 2 x 1. No outro jogo desta primeira rodada, a Escócia venceu a Nova Zelândia por 5 x 2, e os neozelandeses, apesar da derrota, tornam-se os primeiros dentre os países da Oceania a marcar gol em Copas, através do jogador Steve Summer, quando o placar marcou 3 x 1 para os escoceses. O segundo jogo do Brasil foi contra a seleção escocesa. Mais uma vez o Brasil ganhou fácil: 4 x 1. No outro jogo desta rodada, o jogador soviético Sergey Baltacha anotou o gol de número 1.100 da História das Copas a fazer 3 x 0 na Nova Zelândia. E contra a fraca Nova Zelândia, no primeiro confronto do Brasil contra seleções da Oceania, mais quatro gols e a maior goleada sobre uma seleção da Oceania: 4 x 0. O jogador Zico, autor do gol de abertura do placar, anotou o primeiro gol brasileiro e sul-americano sobre uma seleção da Oceania. E passamos pela Primeira Fase, ao lado da URSS, maravilhando o mundo com a beleza dos espetáculos apresentados pela nossa “seleção canarinho”.

Pelo grupo A, cinco empates em seis jogos realizados no grupo, levaram Polônia e Itália a fase seguinte. O empate em 0 x 0 entre Peru e Camarões pela primeira rodada foi o primeiro empate registrado entre seleções sul-americanas e africanas. O empate sem gols também foi a maior sequência até então de uma seleção sem marcar gols, com o Peru alcançando 4 jogos sem balançar as redes, marca quebrada apenas três Copas depois. Fato curioso foi a desclassificação da seleção de Camarões, invicta, com três empates, tendo sofrido apenas 1 gol nesses jogos. Era a terceira vez na História das Copas que uma seleção deixava o torneio sem perder nenhum jogo. Além disso, com os dois resultados de 0 x 0 nos dois primeiros jogos, camaroneses igualaram um recorde alcançado apenas em 1930 por três seleções (Uruguai, Chile e EUA) de não sofrer gols em dois jogos consecutivos desde a estreia em Copas.

Pelo Grupo B, os alemães estrearam sendo derrotados pela Argélia no jogo que marcou a primeira vitória de um selecionado africano sobre um selecionado europeu. No jogo seguinte, a vitória dos alemães sobre o Chile igualava o recorde de três vitórias seguidas em confronto, também ocorrido em 1962 e 1974, recorde este pertencente ao Brasil nos confrontos com os suecos, em 1958, e os mexicanos em 1962. A Alemanha também marcou a sua 50ª participação em uma partida de Copa do Mundo, no jogo em que derrotaram a Áustria pelo placar de 1 x 0. A Argélia ainda venceu o Chile por 3 x 2 e fez história marcando também a primeira vitória de uma seleção africana sobre uma seleção sul-americana, além do primeiro gol africano sobre sul-americanos, ao anotar 1 x 0 com o jogador Salah Assad.

Pelo grupo C, a Hungria aplicou sobre El Salvador a maior goleada da História das Copas: 10 x 1. Este resultado, além de superar as goleadas da própria seleção húngara, em 1954, e da seleção iugoslava, em 1974, tornou a seleção da Hungria a única a conseguir dois dígitos no marcador em um jogo pela Copa do Mundo. Evidentemente, este também foi o jogo com o maior número de gols dessa Copa. Ainda nesse grupo, a Argentina tornou-se a primeira seleção campeã a estrear com derrota no torneio seguinte e El Salvador terminou sua participação em último lugar, repetindo 1970 e, por ter disputado apenas esses dois torneios, tornou-se a única seleção participante em mais de uma Copa a terminar na lanterna em suas duas participações. Também registrou a marca negativa de segunda pior sequência de jogos sem marcar pontos desde a estreia, em 6 jogos, perdendo apenas para a marca registrada por outra seleção da Concacaf, o México, com 9 jogos, da estreia até primeira rodada de 1958 sem marcar pontos. É também a 4ª pior sequência de jogos sem marcar pontos entre todas as partidas disputadas em Copas até então.

Pelo Grupo D, o empate em 1 x 1 entre Tchecoslováquia e Kwait na primeira rodada registrou a primeira e até então única estreia de uma seleção asiática em Copas sem ser derrotada. No jogo Inglaterra 3 x 1 França, o gol de abertura do placar, marcado pelo jogador inglês Brian Robson, alcançou a marca de 4º mais rápido da História, ao ser anotado aos 27 segundos de jogo.

Com dois empates consecutivos em 1 x 1 contra Espanha e Irlanda do Norte, a seleção hondurenha estreou pelo Grupo E igualando a marca de EUA, em 1930, e de Cuba, em 1938, ao conseguir 2 jogos de invencibilidade desde a estreia em Copas para seleções da Concacaf. E o jogador norte-irlandês Norman Whiteside, ao fazer parte do time que enfrentou e empatou com a Iugoslávia na estreia dessas seleções nessa Copa, tornou-se o jogador mais jovem a participar de uma partida na História da Copas, com apenas 17 anos e 42 dias, superando o brasileiro Pelé, em 1958.

Na fase seguinte, coube ao Brasil o grupo C, ao lado de Argentina, detentora do troféu, e da Itália. O primeiro jogo foi entre Itália e Argentina. Apesar da fraca campanha na Primeira Fase, classificando com três empates e de a Argentina ser a campeã mundial da Copa anterior, a Itália conseguiu a vitória por 2 x 1, no jogo que igualou o recorde até então vigente de confronto em três Copas seguidas, também ocorrido em 1962, entre alemães e iugoslavos. O Brasil jogou, então, com a Argentina. Mais uma vez o selecionado brasileiro não tomou conhecimento do adversário e venceu por 3 x 1. Era a sexta vitória consecutiva da seleção brasileira em Copas, considerando as vitórias sobre a Polônia e a Itália na Copa de 1978, igualando a segunda melhor marca de vitórias consecutivas até então, alcançada anteriormente pela Inglaterra e pelo próprio Brasil em 1970. Com melhor saldo de gols, o Brasil entrou no jogo decisivo, no estádio Sarriá, favorecido pelo empate, no jogo que também igualou o recorde vigente de três partidas em Copas consecutivas, ainda hoje um recorde do selecionado brasileiro. Paolo Rossi, porém, reverteu a vantagem para a Itália, fazendo 1 x 0. Sócrates conseguiu empatar, anotando o gol de número 200 de sul-americanos sobre europeus na história das Copas. Mas antes do final do primeiro tempo, Paolo Rossi, novamente, numa falha da defesa, colocou a Itália à frente. Voltamos ao segundo tempo dispostos a arrancar o empate a qualquer custo. Ele veio dos pés de Falcão, num belíssimo chute de fora da área. Mas o dia era mesmo de Paolo Rossi. Após um escanteio, a bola acha o “bambino de oro” dentro da área brasileira, que com um desvio anota números finais ao placar. Nem mesmo uma excelente cabeceada do zagueiro Oscar, há alguns minutos do final do jogo, conseguiu livrar o Brasil da derrota. O excepcional goleiro Dino Zoff defende a bola em dois tempos, quase em cima da risca fatal. E a “Azurra” acabava com a arte brasileira na Espanha. Era a quarta derrota do futebol arte na história das Copas.

No grupo B, a Inglaterra, com dois resultados em 0 x 0, repetiu o feito de Camarões e abandonou a Copa sem ter sido derrotada em nenhum jogo, o quarto caso na História das Copas, também sofrendo apenas 1 gol. Além disso, a sequência de 4 jogos sem sofrer gols, desde a segunda rodada, igualou o recorde até então de defesa não vazada, alcançada pela primeira vez pelo Brasil em 1958 e igualada por outras cinco seleções além da Inglaterra. Era da Alemanha a vaga deste grupo para a Semifinal, que havia vencido os donos da casa, além do empate sem gols com os ingleses.

Juntando-se aos bicampeões Itália e Alemanha Ocidental, Polônia e a França de Michel Platini, chegaram para a disputa das vagas para a grande final. Repetindo o jogo da Primeira Fase, Itália e Polônia entraram em campo. Mais uma vez o predestinado Paolo Rossi, com dois gols, levou a Itália à classificação: 2 x 0. Do outro lado, uma das mais empolgantes Semifinais da história.

França e Alemanha Ocidental empataram o tempo regulamentar em 1 x 1. O gol de empate francês durante o tempo normal foi marcado pelo jogador Michel Platini em cobrança de pênalti, registrando a primeira vez que uma seleção marcava dois gols de pênaltis sobre a outra em Copas distintas, já que o gol do francês Raymond Kopa na vitória de 6 x 3 sobre a Alemanha Ocidental também foi anotado em cobrança de pênalti. Era a quinta prorrogação da seleção alemã na História das Copas, a maior marca até então. Já a França voltava a uma prorrogação 10 Copas depois, após se tornar uma das duas primeiras seleções a disputar um tempo extra na História das Copas. Assim como na emocionante Semifinal de 1970 entre Alemanha Ocidental e Itália, essa prorrogação também teve mais gols que o jogo principal. A França abriu 3 x 1, mas viu os alemães diminuírem antes do final do primeiro tempo e, no segundo tempo da prorrogação, cedeu o empate em 3 x 3. Com 4 gol no tempo extra, esse jogo teve o segundo maior número de gols em uma prorrogação na História das Copas, e novamente numa Semifinal e com a presença dos alemães, assim como em 1970. Além disso, com os dois gols sofridos de cada lado, a Alemanha tornou-se a seleção com mais gols sofridos em prorrogações, com 7 gols sofridos, posição que ocupa ainda hoje, porém com 10 gols sofridos, e a França, a terceira seleção que mais sofreu gols em prorrogação, com 4 gols, hoje ocupando a quarta posição com essa mesma contagem de gols. Na disputa de pênaltis, porém, a Alemanha Ocidental não desperdiçou a chance e levou a vaga para a Final. Foi a primeira decisão por pênaltis na História das Copas e, assim como a primeira prorrogação, teve participação da seleção francesa.

Dois bicampeões classificaram-se para definir quem se juntaria ao Brasil como tricampeão mundial. Pela segunda vez na história o título era decidido entre duas seleções já campeãs. De um lado o jogo pesado da Alemanha Ocidental, do campeão de 1974 Paul Breitner. Do outro, a crescente seleção do infalível Paolo Rossi.

A decisão foi em Madri, mediada por um árbitro brasileiro, Arnaldo César Coelho. E Paolo Rossi é quem abriu o marcador, sendo ampliado mais tarde por Tardelli e Altobelli. O alemão Breitner descontou no final da partida, mas já era tarde para reação. Com o placar de 3 x 1, a Itália se igualava ao Brasil em títulos conquistados. Além disso, o placar do jogo igualou, pela primeira vez de forma consecutiva, o placar da final da Copa anterior, embora a Argentina tivesse construído a vitória com dois gols marcados na prorrogação, na decisão de 1978. Breitner tornou-se o oitavo jogador a marcar mais de um gol em finais de Copa do Mundo e o único dos que marcaram apenas 2 gols a balançar as redes em Copas diferentes: 1974 e 1982. O italiano Giuseppe Bergomi, com apenas 18 anos e 200 dias, tornou-se o 2º jogador mais jovem a jogar e vencer uma Final de Copa do Mundo, em ambos os casos atrás apenas do Rei Pelé. Na outra ponta dessa história, o goleiro italiano Dino Zoff, aos 40 anos e 133 dias, tornou-se o mais velho jogador da História das Copas a jogar e vencer uma Final de Copa do Mundo.

Paolo Rossi sagrou-se artilheiro do campeonato com 6 gols, na 3ª Copa da história em que o artilheiro pertencia a seleção campeã.. A França, porém, era a seleção com melhor ataque da Copa; 16 gols em 7 jogos. Seu adversário na disputa pelo terceiro lugar foi a Polônia que com a vitória igualou o feito de 1974, chegando pela segunda vez em sua melhor colocação na história, o 3º lugar. A estreante Argélia também conseguiu sua melhor posição em Copas: 13º lugar.

Apesar de um alto nível técnico, a Copa de 1982 foi a recordista em resultados 0 x 0 antes da alteração para 32 seleções, que também aumentou o número de jogos. Foram 7 partidas terminadas com este marcador, com um total de 52 jogos e 146 gols marcados. Por outro lado, a média de gols foi a maior desde 1970 e a segunda maior desde 1958, com 2,81 por jogo e uma média de público de 33.967 espectadores.

No balanço final, a Copa de 1982 ficou na lembrança de milhões de torcedores no mundo pela participação da grande seleção brasileira, a melhor equipe montada desde 1970 e até então, mas que caiu diante de uma bem armada Itália e de seu grande artilheiro Paolo Rossi.