História da Copa do Mundo de 1966

Inglaterra, 1966 – No país dos inventores do futebol

Finalmente, a bola rolaria em campos ingleses, criadores do esporte. Um total de 74 países se escreveram para o torneio. Foram estes os 16 países classificados: Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, pela América do Sul; México, pela Concacaf; a estreante Coreia do Norte, pela Ásia; e Alemanha Ocidental, Bulgária, Espanha, França, Hungria, Itália, Inglaterra, Suíça, URSS e a estreante Portugal, pela Europa. Foram 2 estreantes, o mais baixo número de seleções que retornaram após a ausência em Copas anteriores com apenas 1 retorno e o maior número de seleções que participaram de forma consecutiva de Copas no formato com 16 participantes, com 13 seleções participando sucessivamente.

O Brasil foi à Europa com um dos maiores exemplos de desorganização. Possivelmente motivada pela conquista do bi-mundial, a seleção brasileira anunciou a pré convocação de 47 jogadores; o máximo permitido para um Mundial eram 22 jogadores. Com uma preparação que não repetiu a mesma escalação em nenhum jogo e com um time já bastante envelhecido, o Brasil chegava à Inglaterra para a frustrada tentativa de conquistar o tricampeonato.

No primeiro jogo, o Brasil enfrenta a fraca Bulgária e vence por 2 x 0. Assim como aconteceu na Copa anterior, contando as vitórias nos 4 últimos jogos da Copa anterior e essa nova vitória na estreia dessa Copa, os brasileiros estabeleciam a marca de 5 vitórias consecutivas, a segunda melhor marca até então. Mais do que isso, somado aos 6 jogos invictos de 1958 e aos 6 jogos invictos de 1962, o Brasil estabeleceu o recorde de invencibilidade em jogos de Copas do Mundo, com 13 jogos sem provar o gosto amargo da derrota.

Nos jogos seguintes, porém, além da falta de preparo do selecionado brasileiro que não manteve a escalação um jogo sequer, usando 21 dos 22 jogadores convocados (o único jogador a não participar de um jogo foi o ponta esquerda Edu, do Santos, com apenas 16 anos), a violência exercida em campo por húngaros e portugueses, que chegaram a excluir Pelé de campo devido às pancadas sucessivas, levaram o Brasil a desclassificação em dois resultados iguais: Brasil 1 x 3 Hungria e Brasil 1 x 3 Portugal, curiosamente, duas das quatro seleções que o Brasil nunca venceu e Copas e a segunda pior derrota de nossa seleção em Copas a época, figurando atualmente ainda como o quinto pior resultado na história das Copas. Também repetiu a marca negativa de 2 jogos consecutivos sem vitórias, que já havia acontecido em 1954 e seria superado posteriormente, com o agravante de serem também o recorde negativo de 2 jogos sem marcar pontos em Copas. Por outro lado, o lateral direito brasileiro Djalma Santos alcançou o recorde de participações em 4 Copas de brasileiros e sul-americanos. Também se tornou o jogador brasileiro mais velho a entrar em campo em uma Copa do Mundo, aos 37 anos e 138 dias, na derrota por 1 x 3 para a Hungria. Nesse mesmo jogo, o zagueiro Bellini, capitão da seleção que levantou nossa primeira Taça em 1958, alcançou a 3ª marca de jogador brasileiro mais velho em campo, aos 37 anos e 38 dias. Por outro lado, o meio campista Tostão, com 19 anos e 171 dias, tornou-se o segundo jogador brasileiro mais novo a marcar gol em Copas ao empatar o jogo em 1 x 1.

Ainda no Grupo do Brasil, a Bulgária sofreu outras duas derrotas, para Portugal e Hungria. Em ambos os jogos, os búlgaros cederam gol contra aos adversários, com Ivan Vutsov marcando para os portugueses e Ivan Davidov marcando para os húngaros quatro dias depois. Foi o primeiro caso de uma seleção ceder dois gols em uma mesma edição de Copa do Mundo, fato só igualado em 2018.

Evidentemente, a violência não justificava a desclassificação de uma desorganizada seleção brasileira, mas era o prenúncio do que ainda haveria de acontecer no Mundial. Portugal, estreante, dirigida por um brasileiro, Oto Glória, classificou-se apoiada na grande exibição de Eusébio e o Brasil voltou para casa repetindo o fracasso da Itália, em 1950, quando sai precocemente na Primeira Fase do torneio, embora ostentasse o título de atual campeã.

O México, componente do grupo A, entrou em campo com um recorde. O goleiro Antonio Carbajal participava pela quinta vez de um Mundial, recorde que só foi igualado em 1998 e repetido em duas outras Copas depois. A seleção mexicana, porém, não conseguiu passar da Primeira Fase. No jogo de despedida dos mexicanos, ao enfrentar o Uruguai e empatar em 0 x 0, foi registrado o primeiro empate entre uma seleção da Concacaf e uma seleção sul-americana na história das Copas.

Já pelo Grupo B, na estreia da Alemanha Ocidental com a vitória por 5 x 0 sobre a Suíça, o gol marcado por Helmut Haller para encerrar a goleada foi o 10º gols dos alemães sobre os suíços na história das Copas. E a despedida dos suíços da Copa, na derrota por 0 x 2 para a Argentina, a seleção Suíça amargava a marca de 7 jogos consecutivos sem marcar pontos em Copas, atrás apenas da seleção mexicana, que ficou 9 jogos consecutivos sem pontuar.

No grupo D, a grande surpresa do Mundial. Os norte-coreanos, após perderem para os soviéticos na estreia por 3 x 0, empataram com o Chile em 1 x 1, no primeiro confronto e primeiro empate entre asiáticos e sul-americanos em Copa, com um gol do jogador Pak Seung Zin pouco antes do apito final, gol este que foi o primeiro de um jogador asiático em Copas e o primeiro de uma seleção asiática sobre uma seleção sul-americana, além de ser o gol de número 700 na história das Copas. Aliás, o gol de abertura do placar, marcado pelo chileno Rúben Marcos na cobrança de pênalti, foi o primeiro gol de uma seleção sul-americana sobre uma seleção asiática e o primeiro gol de pênalti sofrido por uma seleção asiática em Copas. Dias depois, com um gol de Park Doo Ik, o primeiro de uma seleção asiática sobre uma seleção europeia, a Coreia do Norte desclassificou a seleção italiana já na Primeira Fase ao vencer por 1 x 0, naquele que seria considerado pelos cronistas italianos como o maior desastre da história da “Azurra” em Copas. Com esse triunfo sobre os italianos, a Coreia do Norte foi o primeiro selecionado da Ásia a vencer um selecionado europeu e a marcar gol, pontuar, vencer e passar de fase em uma Copa.

Nas Quartas de Final, os norte-coreanos, porém, caíram diante de outro estreante, Portugal, por 5 x 3, no jogo de maior número de gols desta Copa. De um lado, ao inaugurar o placar para os norte-coreanos com um gol aos 59 segundos de jogo com o gol mais rápido de um jogador asiático, Pak Seung Zin registrou sua quarta marca nessa Copa ao tornar-se também o primeiro jogador asiático a anotar 2 gols em uma Copa, marca ainda não superada, embora igualada por outros nove jogadores asiáticos em Copas posteriores. De outro lado, o português Eusébio, ao marcar os 4 primeiros gols de Portugal no jogo e virando o placar em favor de sua seleção após estar perdendo por 0 x 3, igualou o recorde de gols marcados por um jogador em uma partida até então, que também tinha sido alcançado por outros quatro jogadores antes e ainda foi alcançado por mais um, até ser superado em 1994. Com dois gols anotados na cobrança de pênaltis, também igualou o recorde de gols de pênaltis em um jogo do alemão Fritz Walter, na Copa de 1954.

Outra classificada era a seleção da casa. A Inglaterra passou pela Argentina nas Quartas de Final, num jogo marcado pela péssima arbitragem do alemão Rudolf Kreitlein, que expulsou o argentino Rattin, quando este tentava pedir um intérprete para reclamar da violência da seleção inglesa. Violência que já havia acontecido contra o Uruguai, na Primeira Fase do torneio, sem punição alguma por parte da arbitragem. Por vencerem pelo placar de 1 x 0 e também não terem sofrido gols na Primeira Fase, os ingleses igualaram o recorde até então vigente da seleção brasileira de permanecer 4 partidas sem ver suas redes serem balançadas. Alemanha Ocidental, vencendo o bicampeão Uruguai, e URSS, vencendo a ofensiva Hungria, completaram as Semifinais.

Na última Semifinal da História das Copas em que apenas uma seleção campeã em Copas anteriores, a Alemanha, alcançava uma das quatro vagas, dois resultados iguais, Inglaterra 2 x 1 Portugal e Alemanha Ocidental 2 x 1 URSS, levam ingleses e alemães à grande final. No jogo contra os ingleses, Eusébio diminuiu o placar para os portugueses com mais um gol de pênalti, gol esse que encerrou uma sequência de 4 jogos sem sofrer gols dos ingleses, marca recorde, igualando a seleção brasileira de 1958. A seleção alemã tinha em seu curriculum um título mundial e a maior goleada da Copa: 5 x 0 sobre os suecos.

Dois dias antes da Final, na disputa pela terceira colocação, Eusébio, novamente de pênalti, abriu o placar para Portugal, estabelecendo o recorde ao marcar 4 gols de pênaltis em uma Copa. E José Torres, ao anotar o gol da vitória de sua equipe sobre a URSS por 2 x 1, anotou também o gol de número 300 nos confrontos entre europeus em Copas do Mundo.

O estádio de Wembley, em Londres foi o palco da decisão, que também marcava o jogo de número 200 na História das Copas. Mais uma vez, a sexta em oito Copas, a seleção que se tornaria campeã começa perdendo. Haller abre o placar para os alemães. Hurst, empata antes do término da primeira etapa e Peters, vira o jogo para os ingleses no segundo tempo. Antes do final, porém, Weber, consegue o empate para os alemães e leva o jogo a prorrogação, a segunda em uma Final na História das Copas e a única desta Copa.

Na prorrogação aconteceu o lance, provavelmente, mais polêmico de todas as Copas. O autor do primeiro gol inglês, Hurst, chuta a bola em direção ao gol alemão. Esta, caprichosamente, bate no travessão e pinga no solo numa posição até hoje discutida. Muitos alegam que a bola não ultrapassou a linha de gol; outros acreditam que houve o gol. De qualquer forma, o árbitro suíço Dienst, validou o gol. A decisão provocou protestos sem efeito dos alemães, que antes do final da prorrogação ainda sofreriam o quarto gol, novamente de Hurst, sendo o terceiro jogador na História das Copas a marcar dois gols em uma prorrogação. E a final, pela terceira vez, acabava em 4 x 2, a única, porém, com prorrogação.

Era a primeira vez na história que uma seleção sem títulos mundiais, a Inglaterra, enfrentava na final uma seleção já campeã anteriormente, a Alemanha Ocidental, e vencia. O inglês Hurst entrava para a história como jogador recordista de gols em um único jogo final de campeonato com os 3 gols assinalados, recorde que perdura até hoje. Esta marca também igualou o recorde de gols marcados em Finais, que pertencia ao brasileiro Vavá. Com as 4 vitórias anteriores nessa Copa, a Inglaterra também alcançou o Brasil na segunda melhor marca até então de 5 vitórias consecutivas em Copas. Outra marca que os ingleses igualaram aos brasileiros era o fato de vencer a Copa de forma invicta após 6 jogos, marca que o Brasil havia atingido duas vezes, no bicampeonato em 1958 e 1962.

A sensação do torneio, Portugal, terminou o Mundial com o melhor ataque da Copa, 17 gols em 6 jogos, e com o artilheiro da competição, o moçambicano Euzébio (Moçambique era colônia de Portugal, podendo ceder jogadores ao selecionado português), com 9 gols anotados, a 4ª melhor marca da história das Copas, atualmente. Portugal conseguiu, também, sua melhor colocação em Mundiais: 3º lugar. Seu adversário na Decisão do Terceiro lugar também conseguiu o seu melhor resultado na história. A URSS terminou na 4a. posição.

Um fato curioso desta Copa foi a coincidência na classificação final de quatro seleções. A Hungria, com o 6º lugar, a Itália, com o 9º lugar, a Bulgária, com o 15º lugar e a Suíça, com o 16º lugar, repetiam a mesma colocação de 1962. A Suíça, aliás, tornou-se a primeira seleção a figurar na última posição em duas Copas e de forma consecutiva. Além disso, Hungria e Bulgária se enfrentaram na Primeira Fase de ambas as Copas, com duas vitórias dos húngaros.

Curiosamente, esta Copa teve o mesmo número de gols da Copa anterior, e, devido à mesma quantidade de jogos, 32, teve também a mesma média.

Esta Copa é lembrada como a mais violenta da história. Devido a este fato, a FIFA resolveu adotar cartões amarelo e vermelho para as Copas seguintes, na tentativa de coibir lamentáveis cenas, como as ocorridas nesse torneio.

Era o primeiro e único título dos inventores do futebol até então.