História da Copa do Mundo de 1990

Itália, 1990 – A decepção italiana e o tricampeonato alemão

Mais uma vez, assim como a Copa anterior, a sede do torneio seria em um país que já havia sediado, anteriormente, uma edição da Copa. A Itália ganhava o direito de ter em suas terras a antepenúltima Copa do século. Na primeira vez em que sediou a Copa, em 1934, a seleção italiana sagrou-se campeã. Agora, já com três títulos em seu cartel, o selecionado italiano buscava, em casa, ser o primeiro tetracampeão da história.

Pela segunda vez (a primeira ocorreu após o fim da 2º Guerra Mundial) o número de inscritos diminuiu em relação à Copa anterior; foram 116. Após a eliminatória, estavam presentes na velha bota 24 seleções: Argentina, Brasil, Colômbia e Uruguai, pela América do Sul; Camarões e Egito, pela África; EUA e a estreante Costa Rica, pela Concacaf; Coreia do Sul e o estreante Emirados Árabes, pela Ásia; e Alemanha Ocidental, Áustria, Bélgica, Escócia, Espanha, Holanda, Inglaterra, Itália, Iugoslávia, Romênia, Suécia, Tchecoslováquia, URSS e o estreante Eire, pela Europa. A seleção egípcia tornava-se a seleção com mais tempo ausente entre duas Copas. Havia estreado em 1934, na Itália, e voltava agora, 56 anos ou 11 Copas depois, uma vez que não tivemos Copas em 1942 e 1946. Foram 3 estreantes, 10 seleções que retornaram após a ausência em Copas anteriores e 11 seleções que participaram de forma consecutiva.

O torneio repetiu as regras de classificação adotadas em 1986.

O selecionado brasileiro partiu para a Copa depois de uma tumultuada classificação nas eliminatórias. Jogando a última partida da eliminatória contra o Chile, no Maracanã e dependendo apenas do empate, o Brasil vencia por 1 x 0, quando um rojão disparado da arquibancada estoura próximo ao goleiro chileno Rojas. Ciente de que seus companheiros não reverteriam o placar pois já passava da metade do segundo tempo e o Brasil dominava o jogo, Rojas simula um ferimento, alegando ter sido atingido pelo rojão. O time chileno abandona o campo e o juiz dá por encerrada a partida. No julgamento, o Brasil é declarado vencedor do jogo com o placar de 2 x 0. Ao Chile coube a punição de não participar de torneios internacionais por quatro anos, o que implicou na não participação do selecionado chileno na eliminatória da Copa seguinte.

Na Itália, o time brasileiro dirigido por Lazaroni, não empolgava. Começamos enfrentando a Suécia, pela quinta vez na História das Copas, igualando ao recorde de confronto da época. Vencemos por 2 x 1 e igualamos o recorde de invencibilidade em confrontos também dos brasileiros só que sobre os tchecos, alcançado em 1970 e que seria igualado pela Itália sobre a Argentina, nas Semifinais. Na partida seguinte, o adversário era a estreante Costa Rica, a qual derrotamos por um “magro” 1 x 0. O mesmo “magro” placar selou nossa participação na Primeira Fase: Brasil 1 x 0 Escócia. Como diz o velho ditado futebolístico, vencíamos, mas não convencíamos. Na vitória de virada de Costa Rica sobre a Suécia, na última rodada, o gol sueco que abriu o placar, marcado pelo jogador Johnny Ekström, foi o gol de número 1.400 da História das Copas. Encerramos a fase em primeiro no grupo, com três vitórias em três jogos. Porém, apresentamos um futebol de baixo nível.

Nos outros grupos, com algumas exceções, o mesmo marasmo imperava nos campos italianos. Destaque para o Grupo A, com o 50º jogo da Itália em Copas, na partida em que derrotou a Tchecoslováquia por 2 x 1. Também vale ressaltar o confronto entre Itália e Áustria, em que os italianos igualavam a marca do Brasil sobre os mexicanos de enfrentar três vezes um mesmo adversário em Copas sem sofrer gols e a marca do Brasil sobre mexicanos e suecos e da Alemanha sobre chilenos de conquistar três vitórias nos três confrontos até então. No jogo entre tchecos e austríacos, o gol Michal Bilek, para a Tchecoslováquia, foi o sexto gol de pênalti sofrido pela Áustria, a segunda maior marca até então, perdendo apenas para o Brasil. Atualmente, a marca negativa dos austríacos é a quarta maior.

No Grupo B, a vitória de Camarões sobre os atuais campeões, os argentinos, por 1 x 0 no jogo de abertura teve o mesmo placar da derrota argentina para a Bélgica na abertura da Copa de 1982, onde também vinha como campeã da Copa anterior nas únicas duas ocasiões em que isso aconteceu até então. Após vencer a Romênia, a seleção camaronesa tornou-se a primeira seleção africana a vencer duas partidas consecutivas em Copas, recorde igualado por outras três seleções africanas, mas ainda não superado, e também atingiu a terceira melhor marca de invencibilidade e de invencibilidade desde a estreia em Copas de uma seleção, com os 2 jogos dessa Copa e os três jogos de 1982, atrás apenas dos campeões mundiais Uruguai, com 11 jogos, e Itália, com 9 jogos, sendo a melhor marca de uma seleção africana.

Outro fato importante ocorreu, pelo Grupo D, onde Alemanha e Iugoslávia fizeram o quinto jogo em Copas, igualando o recorde da época pertencente aos confrontos Brasil e Tchecoslováquia, em 1970, Brasil e Espanha, em 1986, Brasil e Suécia, na Primeira Fase dessa Copa, e Argentina e Itália, que igualariam nas Semifinais também dessa Copa.

Já a Espanha, pelo Grupo E, anotou, com o atacante Michel, o gol de número 50 de uma seleção europeia sobre uma seleção asiática ao dar números finais na vitória por 3 x 1 sobre a Coreia do Sul. Também sobre a Coreia do Sul, a vitória da seleção uruguaia na última rodada, por 1 x 0, encerrava o terceiro pior jejum de vitórias de uma seleção em Copas do Mundo até então, com 11 partidas sem comemorar ao final do jogo, de longe a pior sequência sem vitórias de uma seleção campeã mundial e a mesma marca, no sentindo inverso, da invencibilidade desde a estreia da seleção uruguaia citada acima. Atualmente, esta sequência negativa ocupa a sexta posição.

Pelo Grupo F, o gol de empate do Egito contra a Holanda, marcado pelo jogador Madgi Abdelghani, foi o primeiro gol de pênalti convertido por um jogador africano em Copas. O grupo terminou com a marca de 5 empates em 6 jogos, sendo que nenhuma seleção fez mais que um gol nos jogos.

Definidos os dezesseis componentes das Oitavas de Final, o Brasil enfrentaria a Argentina, de Maradona, porém, bem menos afinada que em 1986. Dominamos a partida e até chutamos bola na trave. Mas numa falha da defesa brasileira, o baixinho Maradona serve a Cannigia que acerta as redes brasileiras. Foi o 10º gol sofrido pelo Brasil de uma seleção sul-americana no 10º confronto entre a nossa seleção e uma seleção sul-americana na História das Copas. E foi suficiente para deixar o Brasil, pela primeira vez desde 1966, fora dos oito primeiros colocados. Se a Argentina não merecia vencer o Brasil, tampouco os brasileiros mereciam seguir adiante.

Além do Brasil, o Uruguai também caiu nas Oitavas de Final ao ser derrotado pelos donos da casa.

Surpresa positiva somente a seleção de Camarões que chegou, pela primeira vez na história de um time africano, às Quartas de Final. A vitória sobre a Colômbia também registrou quatro marcas importantes para o lendário atacante camaronês Roger Milla: anotar o primeiro gol africano em uma prorrogação de Copa do Mundo; marcar dois gols numa prorrogação, tornando-se o quinto jogador na História das Copas a conseguir tal feito; com os dois gols anotados no mesmo jogo, tornou-se o terceiro jogador africano a atingir tal marca e por duas vezes nessa Copa, contra Romênia e Colômbia; e alcançar a marca de 4 gols em uma mesma Copa, o recorde para jogadores africanos. Por outro lado, o gol do colombiano Bernardo Redín, que deu números finais ao placar do jogo em 2 x 1, foi o primeiro gol sofrido em prorrogação por uma seleção africana.

No jogo entre Alemanha Ocidental e Holanda, o gol do holandês Ronald Koeman, dando números finais à vitória alemã, foi marcado através de cobrança de pênalti. Os alemães sofriam o 5º gol de pênaltis na História das Copas, ficando logo atrás da marca dos austríacos, enquanto que os holandeses alcançavam a marca de 9 gols de pênaltis em Copas, um recorde até então e que seria igualado pelos próprios alemães na Final dessa Copa.

A Bélgica perdeu para a Inglaterra, com um gol David Platt durante a prorrogação, tornando a seleção belga a terceira a sofrer mais gols em prorrogação na História das Copas até aquele momento, marca que ainda permanece, porém com um gol a mais sofrido. Outro recorde registrado nesse jogo foi conquistado pelo goleiro inglês Peter Shilton, que alcançou 10 jogos sem sofrer gols em Copas, ultrapassando as marcas do alemão Sepp Mayer e do brasileiro Emerson Leão, com 8 gols, ambos alcançados na Copa de 1978.

E se não fosse a inexperiência dos africanos, que chegaram a estar vencendo, no segundo tempo, a Inglaterra por 2 x 1, eles teriam ido mais longe. Sofreram um gol antes do final do jogo, empatando em 2 x 2 e levando a decisão da vaga para a prorrogação. Resultado final: Inglaterra 3 x 2 Camarões. Mesmo assim, a 7ª colocação do selecionado de Camarões foi a melhor posição alcançada por um time da África na história das Copas. Também foi a primeira seleção fora do eixo Europa/América do Sul a participar de duas prorrogações em uma mesma edição de Copa. Além disso, o gol de empate de Camarões, anotado por Emmanuel Kundé e os dois últimos gols da Inglaterra, ambos anotados por Gary Lineker, tiveram origem em cobranças de pênalti, igualando a marca de três gols de pênaltis em uma partida, alcançada na Copa passada. E Lineker entrava para o rol dos jogadores que converteram duas cobranças de pênaltis em gols em um único jogo, juntando-se a outros cinco atletas. Mais que isso, ajudava a Inglaterra a tornar-se, até aquela Copa, a seleção com a segunda melhor marca de gols convertidos de pênaltis na História das Copas, com 4 gols.

Outro fato marcante das Quartas de Final foi o recorde alcançado pela seleção da casa, a Itália, ao terminar sua quinta partida seguida sem que seu goleiro Walter Zenga sofresse um gol sequer, fato não igualado ou superado por nenhuma outra seleção.

A Alemanha Ocidental, que havia sofrido o quinto gol de pênaltis de sua história em Copas na fase passada, marcou também, através dos pés de Lothar Mathäus, o quinto gol de pênalti sofrido pelos tchecos na História das Copas na vitória pelo placar mínimo.

Na Semifinal, uma semelhança com 1970. Assim como naquela Copa, os quatro países Semifinalistas já haviam vencido o torneio anteriormente. De um lado Alemanha e Inglaterra. Do outro Argentina e Itália, que aumentavam para cinco o número de confronto em Copas consecutivas, um recorde que deve demorar muito para ser alcançado. Desde a Copa de 1974, na Alemanha, argentinos e italianos se enfrentaram, rigorosamente, em todas as Copas até 1990. O resultado final dos dois jogos foi igual: Alemanha 1 x 1 Inglaterra, Argentina 1 x 1 Itália. Foi o 3º empate em 1 x 1 entre argentinos e italianos, um recorde em empates com o mesmo placar nos confrontos entre seleções. Nos pênaltis, prevaleceu a força dos finalistas da Copa anterior, ambas invictas em disputas de pênaltis na história das Copas. A Alemanha chegava pela terceira vez consecutiva a uma final estabelecendo um recorde ao derrotar, também nos pênaltis a seleção inglesa.

A Itália, dona da casa, decepcionava sua torcida ao se desclassificar no único gol sofrido pela seleção até aquela altura do campeonato. Com um empate em 1 x 1 no tempo normal, e que persistiu na prorrogação, o goleiro argentino Goicochea garantiu a classificação de sua seleção nos pênaltis, assim como havia feito nas Quartas de Final, contra a Iugoslávia. Importante, também, registrar que a Itália, ao não perder para a Argentina no tempo regulamentar e prorrogação, igualou a marca do Brasil no confronto com a República Tcheca, em 1970, e no confronto com a Suécia ainda nessa mesma Copa, conseguindo uma invencibilidade de 5 jogos sobre o adversário, recorde que seria quebrado na Copa seguinte pelo Brasil sobre a Suécia, ao alcançar 7 jogos de invencibilidade com os dois confrontos entre as seleções. Outro fato curioso é que Itália e Inglaterra chegavam à marca de 5 participações em prorrogações, enquanto que a Alemanha alcançava sua sexta prorrogação na História das Copas até então. Os ingleses, aliás, igualaram o feito dos belgas, na Copa passada, ao participarem de 3 prorrogações em uma única Copa, só que, desta vez, em três partidas consecutivas, ou seja, nas Oitavas de Final, Quartas de Final e Semifinal.

Na definição de terceiro e quarto lugar, a “Azurra” conseguiu a vitória por 2 x 1 sobre a Inglaterra, terminado a Copa invicta, mas sem o título, como antes já fizera o Brasil, por duas vezes, e Camarões, Inglaterra e Escócia, em uma oportunidade. O único alento à torcida italiana era saber que o jogador Schillaci se tornou o artilheiro da competição, com 6 gols. Do outro lado, o goleiro inglês Peter Shilton alcançou mais uma marca importante nessa Copa, ao se tornar o segundo jogador mais velho a participar de uma partida em Copa do Mundo, aos 40 anos e 292 dias, atualmente a quinta marca da História das Copas.

Pela primeira vez na história uma decisão seria uma repetição da decisão de uma Copa anterior e, até agora, a única vez em que tal fato ocorreu em Copas consecutivas. Argentina e Alemanha repetiriam a final de 1986. Foi o quarto jogo entre as duas seleções em Copas do Mundo. Curiosamente, os dois primeiros confrontos aconteceram na Primeira Fase de um campeonato; já os dois últimos foram por uma final. O estádio Olímpico de Roma recebeu alemães e argentinos para a grande final. A Argentina vinha disposta a repetir a dose da Copa passada. Ao seu lado, o fato de nenhuma seleção sul-americana ter perdido uma final para uma seleção europeia até então.

O jogo, porém, não foi tão emocionante como as curiosidades que o cercavam. Em campo, dois times bem inferiores aos da Copa passada. E, como não podia deixar de ser, uma final bem inferior à de 1986. Somente a seis minutos do final, através de uma cobrança de pênalti, o alemão Brehme conseguiu tirar um dos zeros do placar. Foi o 9º gol de pênalti da seleção alemã na História das Copas, igualando o recorde vigente à época alcançado ainda nessa Copa pelos holandeses. E foi só isso: Alemanha 1 x 0 Argentina. Era o pior placar de uma Final de Copa do Mundo até então, mas foi o suficiente para garantir o tricampeonato da Alemanha. Pela primeira vez um selecionado europeu batia um selecionado sul-americano numa final de Copa do Mundo naquela que marcou justamente a 50ª vitória dos europeus sobre os sul-americanos em jogos de Copas do Mundo. Curiosamente, a Alemanha havia enfrentado durante a Copa, em todos os seus três títulos, em 1954, 1974 e 1990, a seleção da Iugoslávia, vencendo a mesma em todas as três oportunidades.

Essa Final deixou também algumas marcas interessantes: a expulsão do zagueiro argentino Monzon foi a primeira a acontecer em um jogo final de Copa do Mundo; o alemão Illgner tornou-se o primeiro goleiro a não sofrer gols em uma final; e o técnico Franz Beckenbauer igualou o feito do brasileiro Zagallo, tornado-se o segundo atleta a conquistar um título como jogador e um título como treinador.

Além da taça, a Alemanha levou também o título de melhor ataque da Copa com 15 gols em 7 jogos, além da maior goleada da Copa, nos 5 x 1 sobre os EUA. A seleção da Tchecoslováquia também alcançou tal placar, na Primeira Fase, contra os Emirados Árabes.

Na Copa marcada como a de mais baixo nível técnico da história, tivemos 52 partidas e apenas 115 gols, na pior média de gols da história das Copas: 2,21. Também tivemos 15 jogos terminados com a vitória mínima de 1 x 0, a maior repetição até então, só superada em 2010. O público, porém, não decepcionou. Sua média foi de 48.411 espectadores por jogo, mais que o dobro da primeira Copa em terras italianas. Também tivemos um recorde de prorrogações e disputas por pênaltis para decisão de vagas, com 8 tempos extras e 4 jogos decididos nas penalidades máximas, superando a longínqua Copa de 1938.

Roger Milla, jogador camaronês, saiu da Copa como o mais velho jogador a marcar gol em Copa. Aos 38 anos de idade. Milla, que participou da campanha de 1982, anotou 4 gols. Era, talvez, o prenúncio de uma nova fase na geografia do futebol.