Nos domínios do Rei Pelé


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Como inventores do esporte, os ingleses eram considerados, no começo do século, os donos do melhor futebol do mundo. Isso, na época, não deixava de ser verdade, uma vez que, enquanto em outros países o futebol estava começando a se desenvolver, na Inglaterra o esporte já era profissional desde 1885.

O impulso inicial do futebol era visivelmente inglês. Porém, a condição de criadores do futebol levou os britânicos a se auto intitularem superiores às outras nações neste esporte por muitos anos após sua criação, chegando, a não participar de alguns dos primeiros mundiais, sob tal alegação.

A arrogância inglesa impedia que sua seleção se filiasse à entidade que controlava o futebol mundial, a FIFA, desde sua fundação até pouco antes da Copa realizada no Brasil, em 1950. E assim, a seleção britânica se exibia como a detentora do futebol, sem querer se igualar à seleções que julgava inferiores.

Na Olimpíada de 1920, primeiro torneio em que o futebol seria testado internacionalmente, não foram os ingleses os campeões. Talvez por jogarem em casa, já que os jogos de 1920 tiveram como sede a cidade Antuérpia, na Bélgica, os belgas conquistaram o primeiro título olímpico de futebol. Mesmo assim, a seleção belga não foi considerada como a nova rainha do esporte. Era o primeiro torneio e as pressões extracampo influenciaram muito os resultados daquela olimpíada, o que lançou uma sombra de dúvida sobre a superioridade do futebol belga naquela ocasião. Depois disso, a Bélgica não conseguiu praticamente mais nenhum título importante, o que só veio a confirmar sua condição de seleção de segundo escalão.

Como nenhuma nação conseguia se firmar no topo do futebol, a Inglaterra manteve sua suposta, e talvez até provável, superioridade até as olimpíadas de 1924, em Paris. Nessa olimpíada, na terra do fundador da FIFA, uma seleção apareceu com um futebol competitivo, a altura de destronar os discípulos de vossa majestade. O Uruguai conquistava a medalha de ouro vencendo seus adversários e convencendo com seu futebol. As bases que sustentavam os ingleses nas alturas começavam a ruir.

Na olimpíada seguinte, no ano de 1928, em Amsterdã, a seleção uruguaia conquistava pela segunda vez consecutiva a medalha de ouro no futebol. Surgia a “Celeste Olímpica”. Confirmando o que já havia mostrado em 1924, o Uruguai tomava posse do título de melhor seleção do mundo, antes pertencente aos ingleses.

Nesse mesmo ano a FIFA criava o primeiro mundial de seleções a ser disputado, dois anos mais tarde, no país da sensacional “Celeste Olímpica”. E o Uruguai não decepcionou jogando em casa. Venceu a copa e destronou, definitivamente, os ingleses do posto de melhor seleção. Os ingleses não reconheciam a autoridade da FIFA, tampouco, o título de campeão mundial. Porém, a sequência de três títulos internacionais conquistados pela seleção uruguaia, a olimpíadas de 1924 e 1928 e a copa do mundo de 1930, não deixava dúvida de sua superioridade.

A partir disso, foi a vez do Uruguai interferir negativamente na história do futebol. Em represália ao boicote dos principais países europeus ao primeiro mundial, realizado no Uruguai, a seleção uruguaia não participou dos mundiais de 1934 e 1938, deixando o caminho livre para a Itália conquistar, como uma grande equipe, diga-se de passagem, o bicampeonato mundial. Os italianos superavam os uruguaios em copas do mundo e se firmavam como a melhor seleção. E a Inglaterra continuava se negando a se enquadrar nos moldes da FIFA.

Veio a 2ª Guerra Mundial e o futebol, por questões óbvias, foi deixado em segundo plano. Foram doze anos de dormência, cancelando as copas que deveriam se realizar em 1942 e 1946.

A copa de 1950, no Brasil, primeira do pós-guerra, era a grande chance de se conhecer, na verdade, quem seria o detentor do melhor futebol do mundo. A Inglaterra desceu de seu pedestal e participava pela primeira vez de uma copa do mundo. O Uruguai abandonou seu boicote e voltou a participar de uma mundial, ainda invicto em copas e com os três títulos internacionais, já citados acima. E a Itália, única bicampeã mundial, também estava classificada para a copa. Era o tira teima entre as melhores seleções das décadas de 20 e 30 e dos inventores do futebol. Um fato, porém, modificou o que parecia certo. Um lamentável acidente aéreo vitimou o time italiano do Torino, base da “Azurra” àquela época. A Itália chegava enfraquecida e traumatizada à Copa, fazendo uma campanha apagada, não passando da Primeira Fase. Os ingleses também sucumbiram na Primeira Fase, cedendo sua vaga aos Espanhóis. Restou aos uruguaios a grande chance de reassumir a posição no topo do futebol mundial. Venceram pela segunda vez o torneio, igualando-se em mundiais à Itália. Porém, o que se viu nessa copa foi um país, até então pouco tradicional, apresentando um futebol de uma qualidade técnica acima da média. O Brasil encantou os esportistas da época, mas foi derrotado pela forte e tradicional “Celeste Olímpica”. Muitos poderiam analisar que a boa participação do Brasil se devia ao fato de jogar em casa. Mas a realidade era que a seleção brasileira começava a exibir sua qualidade e a impressionar o mundo futebolístico.

Na Copa seguinte, porém, nem Inglaterra, nem Itália, nem Uruguai conseguiram colocar a mão na taça. A Alemanha, com um futebol extremamente compacto, que se via até bem pouco tempo na seleção alemã, levou a Copa, derrotando a melhor seleção do torneio e talvez da história, a Hungria, na Final. Por não ter apresentado um grande futebol e por ter ganho apenas seu primeiro título, a Alemanha não chegou ao topo, mas se tornou uma seleção de respeito a nível mundial.

Em 1958, finalmente, aconteceu o que deveria ter acontecido oito anos antes. O Brasil venceu seu primeiro mundial jogando um futebol indiscutivelmente superior aos adversários. Um menino de apenas 17 anos, conhecido por Pelé, arregalava os olhos do mundo com um futebol pouquíssimas vezes visto. Começava a surgir o mito Pelé e a força da camisa amarela.

No Chile, o Brasil apenas confirmou sua condição de emergente ao topo do futebol. Venceu novamente o mundial, mesmo desfalcado de Pelé após o segundo jogo. O Brasil igualava-se a Uruguai e Itália, com dois títulos mundiais.

Apenas jogando em casa, em 1966, é que os criadores do futebol conseguiram chegar a uma final. Conquistaram seu primeiro e único título.

Finalmente, em 1970, a seleção brasileira provou ser a detentora do melhor futebol do mundo ao conquistar definitivamente a copa JULES RIMET. Sob o comando de Pelé, intitulado pelo mundo futebolístico de Rei, o Brasil tornava-se o primeiro tricampeão mundial e, indiscutivelmente, chegava ao topo do futebol mundial para não mais sair. Pelé conquistava o terceiro título mundial de sua carreira como jogador de futebol, condição não alcançada por nenhum outro jogador na história. O título de melhor futebol do mundo, que abandonou o Reino Unido anos atrás, passava para as mãos de um novo Rei, Pelé.

Após a copa de 1970, pouco mudou no cenário futebolístico. Alemanha chegou ao tetracampeonato, em 2014, justamente no Brasil, reafirmando sua condição de seleção de ponta, mas agora com um futebol menos pragmático e mais técnico. A Itália venceu mais dois mundiais e alcançou o tetracampeonato, em 1982 e 2006, também se reafirmando como uma das grandes forças do futebol mundial. Os únicos destaques foram a Argentina, que até 1970 não havia vencido um mundial, e que venceu os torneios de 1978 e 1986, igualando o feito da decadente “Celeste Olímpica”, que, antes de 2010, não chegava às quartas de final de uma copa desde a mesma copa de 1970, a França que, jogando pela segunda vez em casa, conseguiu finalmente entrar para o rol dos campeões mundiais, confirmando sua ascensão com a brilhante conquista do bicampeonato na última Copa, em 2018, na Rússia, e a caçula entre as campeãs, a seleção da Espanha, com o título de 2010. Os argentinos assumiram o posto do Uruguai no atual estágio da história do futebol sul-americano e mundial. E o Brasil confirmou seu reinado ao se tornar o primeiro tetracampeão, em 1994, e o primeiro e, até então, único pentacampeão mundial, em 2002.

Agora, à espera da primeira Copa realizada no Oriente Médio, em 2022 no Qatar, vamos aguardar para saber quem se destacará, se uma das seleções favoritas confirmará seu favoritismo ou termos alguma nova surpresa, se as seleções menos tradicionais, dos continentes sem títulos, trarão alguma novidade, se o Brasil continuará reinado soberano na História das Copas. Enfim, em breve, uma nova história sobre Copa do Mundo será escrita e incorporará a já vasta coleção de histórias desse esporte e desse torneio que encanta multidões.